Em
discurso diante de milhares de pessoas na avenida Paulista, o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva adotou um tom conciliador com a oposição, gritou "não
vai ter golpe" junto com os manifestantes e disse que é possível consertar
a gestão Dilma Rousseff até o final do mandato, em 2018. Desta vez, ao
contrário do que fizera em falas recentes e seguindo estilo de trégua de carta divulgado
no dia anterior, o petista preferiu não fazer ataques à força-tarefa da Lava
Jato e do Judiciário.
Nos
últimos dias, Lula foi alvo de críticas depois que foram tornados públicos trechos
em que afirma que o STF (Supremo Tribunal Federal) está
"acovardado".
Lula
falou por cerca de 20 minutos, em ato organizado por PT, sindicatos e movimentos
sociais em defesa do mandato da presidente, que enfrenta processo de
impeachment no Congresso.
Em
alguns pontos do discurso, todo de improviso, o petista sinalizou uma trégua
com os anti-petistas do país.
"Não
nos tratem como inimigos. Não veja ninguém de vermelho como se fosse inimigo. A
nossa bandeira verde e amarela está dentro da nossa consciência e do nosso coração."
E completou:
"Temos que convencê-los que democracia é a acatar o resultado do voto da
maioria do povo brasileiro".
PAZ
E AMOR
"Este
país precisa voltar a entender que democracia é a convivência na diversidade",
disse Lula. "Quero é que a gente aprenda a conviver de forma civilizada
com as nossas diferenças", completou o ex-presidente.
"Acho
engraçado que alguns setores ficaram dizendo essa semana inteira que somos violentos.
E tem gente que prega a violência contra nós 24 horas por dia".
"Não
existe espaço para ódio neste país."
Em
outro trecho do discurso, o petista disse que há tempo para ele e Dilma reformarem
o governo. "Dois anos e dez meses com a Dilma são tempo suficiente para
virar a história deste país."
Lula
disse que chegará ao governo para ajudar a presidente ao estilo "paz e amor",
menos radical, adotado na eleição vitoriosa de 2002 que o levou ao Planalto.
"Relutei
muito, desde agosto do ano passado, para aceitar vir para este governo. E ao
aceitar este governo, veja o que aconteceu comigo, eu virei outra vez o
'Lulinha, paz e amor'. "Não vou lá para brigar, vou para ajudar a companheira
Dilma a fazer as coisas que ela tem que fazer neste país."
VOTO DE CONFIANÇA
Em
um pedido de voto de confiança, Lula disse que a presidente Dilma sabe que ele
pode dialogar com os mais diferentes setores da sociedade. "Dilma sabe que
eu posso dialogar com trabalhador, com sem-terra, com pequeno empresário, com
médio empresário, com grande empresário, com fazendeiro, com banqueiro."
Segundo
ele, até 2018, há tempo "suficiente para virar a história deste
país".
Durante
sua fala, o ex-presidente repetiu três vezes que aceitou ser ministro para
poder "ajudar a presidente Dilma a fazer o que precisa ser feito no
país".
"Eu
entrei para ajudar a presidente Dilma. Precisamos restabelecer a paz e esperança
e provar que este país é maior do que qualquer crime do planeta terra, e que
este país vai sobreviver e vai ter fé."
Na
fala, não fez nenhuma menção ao grampo no qual Dilma indica que a sua nomeação
ao ministério é uma forma de protege-lo de eventual pedido de prisão do juiz
Sergio Moro, da Lava Jato.
ADVERSÁRIOS
A
fala de Lula foi algumas vezes interrompidas por aplausos e gritos dos presentes,
que, segundo o petista, estavam aí "porque sabem o valor da democracia".
Numa dessas pausas, seguiu o coro de "não vai ter golpe", numa referência
aos pedidos de impeachment da presidente.
Em
relação aos adversários políticos, disse que eles ainda não aceitaram os resultados
das eleições do ano passado, quando Aécio Neves (PSDB) foi derrotado por
pequena margem para Dilma.
"Eles
acreditaram que iriam ganhar as eleições. Quando a presidente Dilma ganha,
eles, que se dizem estudados, não aceitaram. Eles estão atrapalhando a presidente
Dilma a governar." E repetiu: "Eles vão para Miami fazer compras, e
nós vamos para a 25 de março".
"Tem
gente neste país que falava em democracia da boca para fora, eu perdi eleições
em 89, 94, 98, e antes em 82, para o governo de São Paulo. Em nenhum momento
vocês viram eu ir para a rua protestar contra quem ganhou. Nunca viu."
O ATO
Segundo
a organização, mais de 500 mil pessoas foram ao ato. Ao longo do dia, ônibus
chegaram do interior de São Paulo e do ABC com manifestantes. Eles usam roupas
vermelhas –soltaram até uma fumaça desta cor na avenida–, tocam o jingle que
lançou Lula em 1989, "Lula lá, brilha uma estrela" e cantam
"agora, ficou sinistro, o Lula virou ministro".
O ex-presidente,
aliás, é o protagonista do protesto. Há poucas menções à presidente Dilma. Na
avenida, camelôs tentam, sem sucesso, vender as bandeiras do Brasil que fizeram
sucesso no protesto pró-impeachment de domingo (13). O cantor Chico César se
apresentou na avenida. Ao fim de cada música, gritos de "não vai ter
golpe".
Manifestantes
criam uma jararaca de tecido e cartolinas, em alusão ao animal escolhido por
Lula para personificar a si próprio.
Folha de S. Paulo